A MODA!
A moda é o substrato do esquecimento. Aquilo que hoje
esquecemos foi ontem o nosso encantamento. Aquilo que hoje é o nosso enlevo,
amanhã não passará de recordação. É efémera. Quase me atrevia a dizer que é
inútil, embora aceite que o ser humano é um constante insaciável e, como tal,
necessite da ilusão para se sentir feliz. Mas, a moda entra na nossa vida, sem
bater à porta nem permissão e acomoda-se no sofá da nossa permissividade, o que
no mínimo é alienável e pode configurar total obscurantismo.
Quando falamos de moda não nos estamos a referir, como é
óbvio, apenas, ao vestuário, ao calçado, ao penteado ou outros adereços que
compõem a nossa aparência. A moda é muito mais do que isso e enxameia todos os
sectores da vida nacional só que, umas vezes é mais discreta e outras mais
atrevida e provocatória.
Comecemos pelo futebol. A moda hoje não é jogar bem à bola é,
antes, comentar lances, hipotéticas faltas, estratégica e tácticas de jogadores
e treinadores. Quem tem o palco não são os intervenientes no terreno, são os
comentadores, os especialistas. A moda é, pois, os especialistas. Estes é que
têm tempo de antena. Um jogo demora noventa e poucos minutos, o comentário, por
diversos especialistas, demora quatro horas.
Por aqui vemos, também, que hoje há a moda dos especialistas.
Há-os para todos os gostos e feitios, ainda que a maioria deles nunca tenha
experienciado fazer o que comenta. E, como não sabe fazer, comenta, fala, manda
bitaites, dá palpites.
Se isto é verdade no futebol, também o é nos incêndios, só
para dar um exemplo da actualidade. Ninguém ouve um bombeiro, um comandante de
bombeiros, que anda dias e noites, horas sem fim, no meio de um braseiro
infernal, esgotado, física e psicologicamente, sobre o que está a viver. As
suas angústias e da sua família. As perdas próprias para defender as perdas
alheias, mas aparecem, aos magotes os especialistas estrelados a dizer coisas,
muitas delas sem nexo. E são mais que as mães. Transportados em carros de luxo,
tudo sofisticado, enquanto o bombeiro se deslocou para a tragédia – agora não
se designa assim, porque os estrelados entendem que se deve chamar teatro das
operações - num carro de combate, muitas vezes a cair de podre. São modas.
Mas também os políticos, os que têm as maiores
responsabilidades, que se arrogam o direito de ser especialistas e dizerem que
a culpa é das pessoas que trabalham a terra. Que são descuidados. Que não
registam os terrenos. Que não os limpam. Esquecendo-se que a maioria dos
pequenos proprietários fica sem nada para o seu sustento, não têm dinheiro para
comer e para os medicamentos, quanto mais para limpar uma floresta que não lhes
dá nada, mas que enche os bolsos a muita gente, que nada fez por ela. Enquanto
isso vêem os terrenos cuja responsabilidade é dos organismos estatais sem
qualquer tipo de intervenção, na boa prática de “bem prega frei Tomás, façamos
os que ele diz, mas não o que ele faz”. São especialistas.
Se formas para a Educação, para a Saúde, para a Justiça, para
a Segurança não acontece nada de diferente. Quem mete as mãos na massa – quem trabalha
no duro, não quem se aproveita dos louros ou do dinheiro - não tem voz, mas os
especialistas de gabinete, atordoam-nos com soluções mirabolantes, de sucesso
indiscutível.
São modas e, tal como a moda, talvez passe depressa.
15/07/2022
Zé Rainho
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