LIBERDADE!
Fez anteontem 34 anos que faleceu Zeca Afonso. Os mais novos
não têm forma de saber a importância que este homem teve na minha pessoa e na
maioria da juventude da minha geração, a nível musical. Era preciso ter
contactos nos espaços de venda de discos para se poder comprar um disco do
Zeca.
A música do Zeca era especial. Não devido à qualidade, que
essa eu não tenho competência para avaliar, mas pelas letras cantadas. Pelo
significado das palavras. Pela subtileza das mesmas. Tinha ainda mais dois ou
três aspectos que nos aproximavam. A sua proveniência era beirã, muito próximo
aqui do nosso burgo e residiu em localidades muito próximas de nós,
nomeadamente o Fundão e Belmonte. Outra era o facto de ser um conhecedor e ter
vivências de África tal como nós. Viveu em Silva Porto e Coimbra, onde também
vivemos e, mais importante, a ânsia e a luta pela Liberdade.
Seguimos caminhos diferentes. Ele chegou a ligar-se ao PCP e
esse foi o seu maior erro, quanto a mim. Eu na JOC, Juventude Operária
Católica, em contacto com a luta, no terreno, por uma vida mais digna para
todos os trabalhadores. Sem radicalismos, mas com propósitos e ideais firmes e
objectivos.
Mas não quero, nem me sinto com capacidade para ser biógrafo
do Zeca, apenas quero repescar para aqui o seu sentido humanista, a sua luta
pela liberdade, o seu desencanto e o seu desalento.
Alturas houve em que Zeca lançava um disco e era, sistematicamente,
preso a seguir. Tenho, comprados clandestinamente, a maior parte dos discos em
vinil que o Zeca lançou. Conheço a maioria dos temas. Tenho pena de não os
saber cantar. Mas ele cantava para alertar o povo para as injustiças. “Eles
comem tudo e não deixam nada” é um grito de revolta.
Com este arrazoado quero prestar homenagem ao homem, ao
músico, ao português, na data em que se assinala mais um aniversário da sua
morte, porque esta é uma forma de contribuirmos para que continue a viver na
memória colectiva. Mas, também, para lembrar uma das suas músicas onde ele
cantava “NÃO ME OBRIGUEM A IR PARA A RUA GRITAR”, num paralelismo com aquilo
que se vive no Portugal de hoje, muito parecido com o garrote do antigo regime.
Um pacifista nunca advoga e, muito menos pratica, a violência,
mas não pode pactuar com o silêncio da injustiça.
A Pandemia trouxe para este país um governo eleito democraticamente
que governa com tiques antidemocráticos.
O que acontece nos media de condicionamento de jornalistas
que afrontam o governo é disso um exemplo cabal.
Há muitas medidas governamentais que são atentatórias aos
direitos dos cidadãos. Os grupos de pressão e desinformação que pululam nas
redes sociais ao serviço do Partido do Governo são autênticos exércitos de
intimidação.
O Confinamento retira capacidade organizativa e de
intervenção por parte do cidadão não enfeudado ao partido do poder. O
trabalhador, pobre e desprotegido, sente-se ameaçado e não reage com medo das
consequências. As empresas que não gravitem na orla do poder sentem-se cada vez
mais asfixiadas com medidas castradoras e por sobrecarga de impostos.
Os bens essenciais, como os produtos petrolíferos, gasolina,
gás e gasóleo, sobem para preços proibitivos sem que se esboce um desagrado.
Os bancos não param de aumentar as taxas e, na mesma
proporção, de baixar os juros dos depósitos que estão no nível zero da
remuneração.
O governo decide a seu belo prazer e sem qualquer tipo de
escrutínio como delapida o dinheiro dos contribuintes, como é o caso da TAP,
mas também em subsídios a organizações de carácter racista como a SOS racismo,
ou na feitura de um lago na zona do pinhal interior, Pedrógão Grande, que não
serve para nada, enquanto as populações que perderam tudo, ainda esperam pela
reconstrução de suas casas, para não se falar na opacidade que existe quanto
aos donativos do povo português em 2017, quando da tragédia.
Elencar todas as trapalhadas deste governo e dos seus
titulares é tarefa gigantesca e que daria um volumoso livro. Desde o lítio aos
comboios, dos aviões aos hospitais, dos incêndios à caça selvagem. Mas também
da nomeação do homem de mão para o grupo europeu de combate à corrupção, ao
marido da ministra a quem é entregue a gestão da coisa pública no porto de Sines,
e à quantidade assustadora de nomeações de membros de família dos titulares de
cargos públicos, numa atitude nepotismo insuportável, para não se falar na
corrupção generalizada em todo o país desde o terreiro do paço às autarquias
mais singelas. Mas estas bastam para se avaliar a prestação do actual governo.
Por isso estou como o Zeca: Não me obriguem a ir para a rua
gritar!
25/02/2021
Zé Rainho
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