segunda-feira, 26 de abril de 2021

Ditaduras latentes

 Onde é que eu já vi isto?


Quando a opinião é maltratada pelo séquito de mentecaptos amorfos é preocupante. Quando a história se repete é muito decepcionante.

Há algum desconhecimento, para não dizer desprezo, pela História recente ou passada. Pelos factos e pelas percepções dos sinais. Talvez por isso, este nosso povo seja tão ingénuo que, facilmente, se deixa enganar. 

Se recuarmos ao tempo da monarquia democrática - sim houve em Portugal monarquia democrática - ainda que pouco ou nada se fale disso e, muito menos se ensine aos nossos jovens essa parte da nossa História, verificaremos que, quando um partido político se perpetua no poder passa a haver uma mordaça democrática. Se nos lembrarmos da primeira república constatamos que a volatilidade dos governos conduziu, em poucos anos, ao caos e ao desaparecimento dos partidos responsáveis pela implantação da república. 

Estes dois exemplos extremos seriam suficientes, numa análise simplista, para concluirmos que tão mau é um como outro modelo e que ambos descambam em autoritarismo, quando não em ditaduras. E de democracias musculadas e ditaduras frouxas já temos dose que baste. Vale a pena, pois, estarmos atentos.

O que é local pode, em regra, ser global. Vejamos então o que acontece quando, localmente, um partido político se eterna no poder:

  1. Só para enumerar algumas situações mais correntes e até corriqueiras basta vermos o empregos concedidos aos apoiantes, amigos, familiares e, apenas a estes, sem falar nos ajustes directos aos empresários amigos e com poder angariador de votos e, muitos menos na pequena e até grande corrupção, nem nos abusos de poder verificados quotidianamente. Hoje, a maioria do emprego público não é feito por concurso universal e transparente, mas por entrada pela porta do cavalo, temporária, mas que se vai tornando, a pouco e pouco, definitiva. É claro que é só para quem está nas boas graças dos detentores do poder, os outros não têm hipótese nenhuma de, sequer, sonhar com a possibilidade de um emprego público. Passa, como é óbvio, para uma situação cada vez mais podre, onde a cumplicidade entre benfeitor e beneficiário forma uma teia de interesses que, a dada altura, nem se dão ao trabalho de disfarçar, achando mesmo que é um direito que lhes assiste.
  2. Assistimos a isto no Poder Local, Regional e Nacional, numa promiscuidade que asfixia todos aqueles que não pertencem ao grupo. Se acrescentarmos a influência de associações secretas e uma comunicação social, completamente, domesticada, temos uma mistura explosiva que só pode dar para o torto. 
  3. Pode contrapor-se com o argumento de as eleições esbatem estes perigos eminentes, mas o que a gente vê é a hegemonia, cada vez mais alargada do partido do poder, porque a teia já está de tal modo tecida que as eleições, a maioria das vezes, apenas consolida o poder absoluto, intolerável e perigoso, de quem se encontra no poder. Todos os que não se identificam ou não se acomodam, sofrem as consequências do ostracismo. 
  4. Já vivemos isto no início da segunda república e conhecemos o desfecho, a ditadura militar que veio dar origem ao Estado Novo. 
  5. Nesta democracia com falhas, como é a nossa, segundo relatório internacional, caminhamos, a passos muito largos, para um estado insustentável de abuso de poder, de compadrio, de ocupação sistemática do aparelho do Estado. Veja-se o que aconteceu com a nomeação de um boy para director-geral da segurança social. Um indivíduo sem formação, sem experiência, sem vivência a não ser um militante da jota socialista e de menino de mão dos gabinetes ministeriais. 
  6. O partido socialista está no poder há demasiados anos desde início do regime democrático e, por essa razão é o partido que tem mais casos indiciados de corrupção.
  7. Não se trata aqui de acusar ninguém, mas tão só, uma constatação que pode conduzir ao aparecimento dos tais salvadores da pátria que, regra geral dão mau resultado. 
  8. Esperemos que o mais rápido possível se altere o paradigma, para não nos vermos confrontados com ditaduras sempre latentes.


segunda-feira, 12 de abril de 2021

Estupefacção!

 

Estupefacção!

Em toda a minha vida ouvi dizer que todo o homem tem um preço, afirmação da qual não comungo e muito menos aceito. Não quer dizer que o povo, na sua sabedoria, não tivesse razão para assim pensar, mas quero acreditar que há pessoas que se regem por valores morais e éticos e que consideram que um ladrão é tão ladrão por roubar um tostão, como por roubar um milhão. É o acto que qualifica e não a quantia.

Vem isto a propósito da ordem do dia no País, corrupção, prescrição, culpados, inocentes, juízes e procuradores do Ministério Público. Tenho algumas informações e referências sobre um tal Zé Sapatilhas, que andou aqui pela Covilhã e, ainda jovem, já fazia das suas e não eram bonitas. Filho de pai com poder e com dinheiro, desde cedo, se julgou mais do que ninguém. Depois, passeou-se por Coimbra onde conseguiu um diploma de bacharel em engenharia que lhe deu logo acesso a um lugar na Câmara, como é óbvio por influência e não por concurso público, como deveria ser. Quando já era detentor de muito poder, conseguiu, numa universidade manhosa, um canudo de engenheiro, através de um exame efectuado ao domingo, avaliado por um professor amigo e conivente. Canudo que nunca foi reconhecido pela Ordem dos Engenheiros, logo vale zero, se precisar de o utilizar para comer, com o esforço do seu trabalho. Mas não precisa de trabalhar porque os milhões que lhe passaram pela carteira dão-lhe o conforto de não necessitar de trabalhar. Entretanto tinha assinado uns projectos esquisitos, aprovados por técnicos incapazes, mas detentores de poder, lá para os lados da Guarda. Muitos outros episódios lhe são imputados e são do conhecimento público através da Comunicação Social e, por isso, não vale a pena repeti-los.

Foi, este sujeito, preso e acusado de dezenas de crimes por se ter apropriado, indevidamente, de milhões de euros. Agora há um juiz que diz que o dito sujeito é corrupto, mas que o crime prescreveu e eu fico estupefacto. Então o roubo deixa de ser roubo se se deixar passar algum tempo sem que se descubra ou seja punido pela justiça? Então um ladrão que consegue esconder o produto do seu roubo, e só pelo facto de saber esconder bem o produto de tudo aquilo que roubou, não é punido pela Justiça dos homens? Então um gatuno, só porque roubou muitos milhões e com eles pode pagar a advogados que conhecem os buracos negros da lei - eventualmente, até fazem parte de escritórios a quem pagaram para a elaborar, quando deveria ter sido gizada por juristas competentes e ao ser da causa pública e não dos interesses de uns, poucos - deixa de ser considerado gatuno só por isso, enquanto outro cidadão que rouba um pão no supermercado vai preso? Roubar e não ser apanhado passa a ser virtude?

Então e um juiz, que tem o dever de julgar com justiça e é pago principescamente, para isso, considerando o ordenado médio nacional, tem poder para branquear crimes e não lhe acontece nada?

Será que é lícito a um juiz valorar o testemunho de companheiros e amigos do arguido e desprezar o testemunho de um interveniente no processo que teve conhecimento causal e até participou nos esquemas de corrupção, sem que nada aconteça? Isto é um Estado de Direito ou é uma pocilga?

Sabemos que tudo o que aconteceu na passada sexta-feira não é o fim de nada e até é, nas próprias palavras do visado, o princípio de tudo, mas perante um povo tão sofredor, com bolsas de pobreza inimagináveis, com fome a grassar pelo país fora, muito por culpa desta corja de ladrões, ainda que com a desculpa da pandemia, um cidadão que paute a sua vida pela honestidade pode sentir-se confortável? Não se sentirá incomodado? Não terá de se revoltar?

Dir-se-á que o povo já se revoltou e a prova disso é que anda para aí uma petição, com muitas milhares de assinaturas, para afastar o juiz da magistratura, mas isso vai valer de alguma coisa? O Poder judicial supremo é que tem a competência para tal e a petição é dirigida a um órgão sem a competência devida, como poderá ter efeitos práticos?

Não deveria haver um sobressalto cívico, vastíssimo, de toda a sociedade honesta que não se revê nestes esquemas e nesta sordidez, para que o Poder encarasse o enriquecimento ilícito, seja de quem for e pudesse merecer a dedicação urgente à legislação que impedisse que tal aconteça? Que tal demonstrar já isso nas próximas eleições, não votando em quem esteja, mesmo que seja só indiciado, de práticas contra a ética e contra a moral?

Diz-se com ênfase que todo o criminoso é inocente até trânsito em julgado. No domínio jurídico pode ser assim e, só por isso, o direito já não é direito, penso eu, mas, para mim um criminoso é aquele que comete um crime, independentemente de ser apanhado, ou não, pelas malhas da justiça.

Ontem já era tarde, mas vamos acreditar que ainda há gente de bom senso, de bom carácter e que tudo fará para legislar para que casos destes não se repitam. Alguma coisa tem de ser feita.

12/04/2021

Zé Rainho