segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

Consciência Tranquila

 

CONSCIÊNCIA!

A palavra é simples, o conceito é complexo e abrangente. No domínio da Psicologia leva-nos para o psíquico e respectivo saber sobre o mesmo. Filosoficamente já entra no domínio do conhecimento próprio por distinção daquilo que o rodeia. No campo da moral e da ética pressupõe a capacidade de o indivíduo avaliar os próprios actos e procedimentos. Podíamos continuar para o campo profissional, sentimental, social e por aí adiante, mas para o assunto que queremos abordar podemos ficar por aqui.

Popularmente é comum ouvir dizer-se que, quando uma pessoa desmaia, perdeu a consciência. Também, quando alguém está em coma, num qualquer hospital, que está inconsciente. Ainda, que determinado indivíduo, tem a consciência pesada e por isso não consegue dormir, ou vice-versa, tem a consciência leve e dorme como um anjo.

Independentemente do contexto o conceito de consciência tem variações de acordo com os interesses individuais e, também, com o seu sentido ético, moral e da própria honestidade intelectual.

Assim, a consciência serve para, quase tudo. Por isso é vulgar ouvir-se: tenho consciência de que cumpri, com rigor, o que me propus ou me propuseram. Tenho consciência de que o que fiz e pratiquei foi no sentido do bem próprio e do próximo. Tenho a consciência de que nunca pratiquei qualquer crime ou ofensa contra o outro. Tenho a consciência do dever cumprido. Tenho a consciência de, de, de, …

Porém, todos os dias somos confrontados com notícias de malfeitorias praticadas em todo o mundo, no nosso país, nas grandes cidades e até nas nossas pequenas aldeias, mas, questionados os malfeitores, dizem-se sempre de consciência tranquila e mesmo vítima de cabala, calúnia, ou ofensa, porque estão inocentes, mesmo que os indícios sejam consistentes de que tal afirmação não é verdadeira.

A “consciência tranquila” passou, desta forma a ser a panaceia de todos aqueles que, de facto, só podem estar intranquilos.

No domínio dos cargos públicos, que deveriam ser de serviço ao público, então é a o descalabro total, nas mais diversas esferas e circunstâncias, desde que estejam em lugares de decisão e que envolva dinheiros públicos.

São os ajustes directos injustificáveis. São os concursos tipo alfaiate, com fato à medida do concorrente amigo ou subornador. São as nomeações de gente impreparada, ou mesmo desqualificada, mas que tem um cartão partidário e é muito activo na angariação de votos, para o partido do poder. São as fraudes constantes em empresas públicas ou do domínio público, não escrutináveis. Para não falar nos diferentes poderes desde o autárquico, ao regional ou ao central, onde aí é um fartar vilanagem.

Talvez por isto e por muito mais que se poderia enunciar é o que o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça disse, publicamente, que no país há uma corrupção generalizada e, mesmo assim, os visados vêm afirmar, aparentemente convictos, de que estão de consciência tranquila.

A consciência passou assim a ser plástica, moldável, de acordo com as conveniências. Tenhamos consciência disto.

28/01/2024

Zé Rainho

 

terça-feira, 23 de janeiro de 2024

Inércia

 

INÉRCIA!

Atrás de tempo, tempo vem. Deixa andar que o tempo cura tudo. Estas são as ideias que atravessaram e atravessam o pensamento português ao longo dos tempos. Qualquer tipo de mudança leva uma eternidade e encontra sempre muitos entraves, muitos obstáculos, a maior parte deles estapafúrdios.

Talvez seja a pacatez, deste povo de bandos costumes, alicerçada na figura mítica dos “velhos do restelo” que Camões tão bem caracterizou, que nos leva ao constante e permanente impasse.

Fomos os últimos da Europa a implementar a indústria. Fomos os últimos da Europa a libertar as possessões do império português, além-mar. Fomos os últimos, ou dos últimos, da Europa a adoptar o regime democrático. Somos os últimos a ter uma ferrovia arcaica que limita as nossas deslocações à Europa onde estamos inseridos. E por aí adiante. Poderíamos continuar a enumerar o nosso ancestral atraso, que se vai agudizando a cada ano que passa, deixando-nos na cauda do desenvolvimento e, cada vez mais, transformando-nos num país periférico, para além de o sermos, de facto, geograficamente. Talvez seja também pelo facto de sermos os descendentes dos que cá ficaram, como conta a história do avô para o neto à sua pergunta: avô nós somos descendentes dos corajosos e aventureiros marinheiros que deram novos mundos ao mundo? E o avô, pesaroso, respondeu, não filho, nós somos os descendentes dos que cá ficaram.

Mas, pode ser também, uma questão de preguiça, física e mental, que nos transforma nuns deserdados da sorte. Pode ser o laxismo da nossa forma de estar nos diversos sectores da vida nacional, que vai da educação à saúde, da justiça à segurança social, da economia à política, da vida em comunidade e preocupação de todos para com todos.

Certamente haverá justificações que os sociólogos, historiadores, psicólogos, politólogos e outros mestres das ciências sociais, que serão capazes de apresentar, mas, para nós, é mesmo só o desleixo, a impunidade, a corrupção e a falta de rigor e profissionalismo dos vários agentes com responsabilidades na gestão da (rés)pública.

Vem esta conversa a propósito de muitas aleivosias que o país atravessa, das quais destaco duas, que são muito significativas e caracterizam bem o que acabámos de afirmar. A primeira é a pouca-vergonha e desfaçatez de governantes e responsáveis pelo INEM que se viu sem a prestação de serviços de helicópteros no dia 31 de Dezembro passado, porque, em devido tempo, não abriu o concurso público indispensável. E agora vê-se compelido ao pagamento de exorbitâncias, muitos milhões de euros em ajustes directos, para que a população não fique completamente ao abandono, como está e como se verificou ontem, com um homem que pediu socorro e não foi socorrido por falta de ambulâncias e morreu. A segunda é a Lei eleitoral que nos rege há quase cinquenta anos, meio século e não vejo nenhum partido, nenhum deputado, nenhum agente político a alertar para a obsolescência da situação. Acresce a estas anomalias a passividade popular. Ninguém se indigna. Ninguém se incomoda porque estas coisas só acontecem aos outros. Egoísmo popular exacerbado e indiferença político-partidária.

Cumprindo a responsabilidade que nos cabe enquanto cidadão gostaria de dizer a todos os Partidos que se vão apresentar a sufrágio eleitoral que deveriam incluir nos seus programas uma alínea que, expressamente, dissesse que uma das medidas que iria propor ao Parlamento eleito, em 10 de Março de 2024 será a alteração à Lei eleitoral vigente, que data de 1978. Que indicasse quais as alterações que propunha e, nomeadamente, clarificasse a função e responsabilização do deputado perante o eleitor, independentemente do Partido pelo qual foi eleito. Que todos os votos expressos em urna tivessem igual valor, quer sejam dos grandes centros urbanos, mais populosos, ou de pequenos aglomerados populacionais. Que não houvesse desperdício de centenas de milhares de votos do interior desertificado e se aproveitem poucas dezenas de milhar de votos de Lisboa para eleger um deputado.

Eu sei que é utopia e que pedir clareza, honestidade, transparência e rigor é pedir muito a quem na política está habituado a promover o embuste, o engano, a mistificação, mas não me peçam para ficar calado e não me impeçam de sonhar com um país ambicioso, onde os jovens sintam futuro e os velhos sejam reconhecidos como seus construtores e artífices.

Já agora e para terminar quero pedir aos meus concidadãos que não deixem de ir votar. Que não se abstenham porque é uma vergonha fazê-lo, tendo em conta que é um direito que nos foi negado durante muitos anos e pior, é que se abstendo permitem que uma minoria governe o país e isso não é bom para ninguém e muito menos para a democracia.

23/01/2024

Zé Rainho

 

domingo, 14 de janeiro de 2024

Por Vezes...

 

POR VEZES…

Há alturas em que o nosso país me desilude, me irrita, me constrange e me entristece. Acontece muitas vezes.

Quando vejo urgências de hospitais fechadas e doentes em bolandas, de um lado para o outro, com sofrimento atroz, fico triste e zangado.

Quando assisto a notícias de assassínios de mulheres, pelos seus companheiros, crianças maltratadas, esquecidas ou marginalizadas, fico possesso.

Quando vejo pobreza extrema, reflectida no aumento exponencial dos sem-abrigo, em jovens que têm de emigrar, porque não têm salário compatível com uma vida digna, em muitos portugueses a trabalhar para empobrecer, doí-me por dentro, porque não havia necessidade.

Quando assisto à corrupção, não digo generalizada, mas muito difundida, nos corredores dos vários poderes, o chico-esperto a safar-se à grande e o honesto trabalhador, cheio de mérito a ser deixado para trás, ultrapassado de uma forma vergonhosa, tira-me do sério.

Quando assisto a muitas outras situações, como a marginalidade, a libertinagem, a incivilidade, não só me irrita, mas magoa-me.  

Mas, também, há alturas em que sinto um orgulho enorme em ser português e em ter nascido e viver neste país.

Ontem foi um desses dias. Quando vi, numa cidade pequena, Viana do Castelo, mais propriamente, coabitarem em plena liberdade dois extremos políticos sem atropelos nem nenhum tipo de violência. Falo, como é óbvio, da convenção do Chega e de uma reunião de militantes do Bloco de Esquerda.

Não é preciso ser muito sagaz para perceber que ambos os partidos se situam nos extremos do espectro político nacional, mas que qualquer deles representa uma fatia do eleitorado nacional. Representa, pois, portugueses tão genuínos e autênticos, como todos os outros e, quer votem num ou noutro, isso é uma bênção e é preciso dar graças.

Esta liberdade e esta convivência democrática dá-me uma imensa satisfação e leva-me a fazer paralelismos com países enormes, com muito mais potencialidades, com muito mais dinheiro e poder, onde este tipo de coisas não era possível. Estou a lembrar-me da China, da Rússia, da Venezuela, para referir apenas alguns. Infelizmente há muitos mais, até me dói referir a Coreia do Norte, por exemplo, por ser um caso de extrema violência e desumanidade.

Pela liberdade de pensamento, expressão e conduta, digo com muito orgulho, viva Portugal.

Pela convivência democrática, civilizada, educada, apesar das diferenças e concepções políticas, estou agradecido a este país e por isso digo, veementemente, viva Portugal.

14/01/2024

Zé Rainho

 

quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

Gratidão

 

GRATIDÃO!

A nobreza de carácter vê-se e sobressai, em atitudes e comportamentos simples. Sem espalhafato, sem muitas, ou nenhumas, palavras, e caracteriza-se muito pela forma como tratamos o outro. Com delicadeza, com empatia, com solicitude e até com alegria. Sorriso rasgado, sem fingimento. Abraço caloroso.

Um simples obrigado ou, como dizemos cá na nossa Beira Interior, bem-haja, enche o coração de quem o recebe e, a quem o dá, custa tão pouco. Esta afirmação é ousada, porque só é verdadeira quando nos referimos à tal nobreza de carácter, já que quem a não tem não é capaz destes gestos simples. Destas atitudes, que vêm do berço, da educação recebida, do respeito e consideração pelo outro e, sobretudo, do sentir-se grato pelo que se recebeu para benefício próprio.

Há no nosso burgo um ditado antigo que diz mais ou menos isto: “quem dá não pode dar sempre e quem precisa, precisa sempre”. Por norma é verdadeiro e intemporal. Por isso é tão importante reconhecer ao dador a benemerência, o desapego, a solidariedade. E todos nós recebemos mais do que damos, por isso todos temos razões de sobra para sermos gratos.

Desde logo o dom da vida, o primeiro, o mais importante e imprescindível bem. O benefício de ter uma família. De ter uma casa. De viver em comunidade e em comunhão com os outros. Mas há tantas outras graças e bênçãos que recebemos diariamente e que, infelizmente, nem sequer nos damos conta dessa dádiva. A saúde, a lucidez, a idade. Tanto e tantos benefícios que seria demasiado exaustivo enumerar, mas que sentimos, a toda a hora e momento, se estivermos atentos e, sobretudo se formos, minimamente gratos.

Quando vemos a falta de sentido de alguém que não tem a capacidade de agradecer o que recebe é uma triste e vil vida, porque falha de carácter, generosidade e muito cheia de egoísmo. A ingratidão é demonstrativa da falta de reconhecimento do valor da dádiva. E esta pode ser uma palavra, um alimento, um cobertor, uma cama para dormir ou um benefício fiscal, um subsídio de sobrevivência, se falarmos de bens materiais. Mas, se falarmos do intangível, como o discernimento, a capacidade de pensar, de amar, de sofrer, mas também de rir e de nos alegrarmos por nós e pelos outros, então a gratidão deve ser maior porque a dádiva é incomensurável.

Pena é quando, quem recebe, entende que é dever daquele que dá e não reconhece o benefício recebido.  

Por isso entendemos que a gratidão é uma atitude nobre e o seu antónimo é uma atitude vil. A primeira, objecto de enaltecimento e a segunda, de profundo desprezo.

Por nós queremos agradecer tudo o que temos e somos. Queremos agradecer a família que temos, os amigos que possuímos, as pessoas que conhecemos, a idade que já alcançámos, a saúde que ainda nos brinda no dia-a-dia e, sobretudo, a alegria de acordarmos diariamente e ouvirmos o chilrear dos passarinhos, nos arbustos do quintal do vizinho.

Queremos agradecer por ter nascido neste rectângulo à beira-mar plantado, ainda que, muitas vezes, nos zanguemos com os governantes que tal mal nos tratam e gostássemos de ter uma vida em que nos sentíssemos respeitados e tratados com equidade e não abandonados neste interior onde tudo falta, menos a paisagem luxuriante, o ar puro respirável e a água límpida dos ribeiros e a generosidade dos seus habitantes.

Queremos agradecer o sistema social em que vivemos, onde a liberdade ainda é um bem sentido, se compararmos com outras latitudes, onde essa falta é motivo de discriminação e silenciamento.

Por fim, que deveria ser o princípio, queremos agradecer a Deus tudo o que nos dá e, particularmente, o Seu amor e misericórdia.

10/01/2024

Zé Rainho

Que se Passa!

 

QUE SE PASSARÁ!??

Ontem, pelas 15h15, estacionei o carro no parque anexo à Biblioteca Municipal e percorri o centro da vila a pé.

A Vila é sede de concelho, tem serviços públicos, tem duas agências bancárias, tem paços do concelho, tem várias igrejas, tem duas farmácias, tem cafés, alguns, poucos, restaurantes, algum comércio.

O meu percurso foi sair do parque de estacionamento e começar a descer em direcção ao Jardim da República, passando pela Igreja matriz e pela zona dos cafés até à Óptica, para dar um pequeno arranjo aos óculos, ferramenta indispensável para a minha vida diária.

O dia, era um daqueles dias invernosos, nem, nem. Nem chove, nem faz sol. Céu plúmbeo, frio, mas não excessivamente, o normal para a época, como diriam os meteorologistas.

O percurso que fiz serão cerca de 500 metros, ou nem tanto, mas é o centro urbano onde tudo se passa. Vi uma única pessoa, em pé, próximo da caixa multibanco e passou por mim um carro da GNR com dois agentes dentro. Não vi mais ninguém. Nem vivalma.

Perante isto pergunto-me: o que se passará? A vila já não tem habitantes? Tem, mas estão demasiado velhos e, por isso, são mais atraídos por umas quentinhas pantufas do que por uma boa passeata? Não tem jovens em idade de trabalhar que precisem de ir a um serviço público, a um comércio, ou qualquer outra actividade? Não sei responder a nenhuma destas perguntas. Só sei que não é normal, uma localidade com cerca de 1500 habitantes, às três da tarde, não ter ninguém na rua.

Nas aldeias do concelho esta era uma situação habitual, na vila onde toda a população do concelho se tem de deslocar para obter serviços diversos e indispensáveis é que não é normal, penso eu. Ou estarei errado?

Se pensarmos em sentido mais macro e compararmos com o que se passa no resto do país não podemos deixar de questionar: que tipo de ordenamento do território é este? Quem é que tem uma estratégia que minimize o suplício de quem não consegue ir trabalhar, porque não cabe dentro do combóio e esta desertificação, num território tão pequeno, que é minúsculo comparativamente com muitos outros países?

Quem é que tem planos para o interior do país, interior que começa a 50 km de distância do mar? Quem é que apresenta medidas objectivas e fazíveis para alterar esta situação?

Em véspera de eleições legislativas sugiro aos meus amigos que têm tempo e disponibilidade, que leiam os programas de todos os partidos que se vão apresentar ao sufrágio universal. Aviso já que é uma seca. É uma estopada, mas é a única forma de podermos, em consciência e não de forma clubística, votar, para alterar este estado de coisas.

Eu sei que os novos não têm tempo para estas minudências, mas os velhos, que passam muitas horas a olhar para uma televisão que não traz nada de novo, talvez ocupassem melhor o seu tempo, até para poderem fazer como fez ontem aquele professor que confrontou o PM com a sua forma de governar e ele, de forma agressiva, mal-educada, não foi capaz de responder com verdade e argumentos reais e virou as costas. A cidadania não se exerce só nas urnas, exerce-se no dia-a-dia.

11/01/2024

Zé Rainho