sábado, 4 de setembro de 2010

Força de viver

Há dias em que é preciso ter alguma coragem para viver, principalmente, quando convivemos com situações dramáticas de doenças (ditas de incuráveis), ou de sofrimento dos que nos estão próximos, das diferentes formas que a vida nos aproxima ou nos afasta.
Quando algumas dessas pessoas nos são queridas e o sofrimento é maior às vezes o desânimo vem e apetece desistir. Mas oh! incongruência: quantas vezes não são as próprias pessoas que sofrem as enfermidades que nos mostram uma força interior que nos deixam boquiabertos e estupefactos.
Estou a viver um desses momentos hoje. Vi num Blogue de uma amiga minha com cancro mamário, com 40 anos de vida, algumas notícias que me alarmaram e intuí que ela estaria com o moral em baixo. Como os amigos são para as ocasiões decidi, de imediato, escrever-lhe um E_Mail dando-lhe conta das minhas preocupações e das minhas angústias. Qual não é o meu espanto quando recebo de volta um arrazoado de vitalidade e de força de viver que me deixou atordoado.
Tenho consciência das minhas fragilidades, principalmente, quando estas estão relacionadas com a doença - própria ou dos outros - e, com toda a franqueza, não me estou a ver com este espírito lutador, com esta garra e esta força para agarrar a vida que, tenho a certeza, ela sente a fugir-lhe por entre os dedos, qual areia do mar que tentamos apertar numa das mãos. Mas, mesmo assim, em vez de desalento vejo confiança; em vez de desistência vejo empenho; em vez de comiseração vejo altivez; em vez de fraqueza vejo força. E isto tudo me confunde os neurónios porque me parece paradoxal. O mais normal seria que existisse nela o inverso do que acabo de descrever.
Por tudo isso a vida me surpreende todos e cada dia. Cada instante que passa sou confrontado com esta dicotomia "vida e morte". E, quer numa quer noutra, encontro razões que me levam a acreditar que esta passagem breve pela vida, não é mais do que um constante e permanente caminhar para a morte mas, ao mesmo tempo, um caminhar no sentido de alcançar uma outra vida, seja ela qual for.
 Fico sempre "doente" e magoado interiormente, quando perco alguém querido e, ainda ontem, num momento de alegria e de convívio com vários amigos tive a triste notícia da perda de um desses amigos com quem, apenas há cerca de dez dias, tinha conversado e depois nada mais soube dele senão que já tinha sido enterrado. Calcularão os meus amigos, principalmente aqueles que me conhecem bem, como sofri. Sofri, em primeiro lugar, a perda. Sofri o facto de não saber a notícia em tempo útil para, pelo menos, o poder acompanhar à sua última morada, nesta terra dos vivos.
É por isto e por muitas outras coisas, que o tempo e as palavras não permitem, agora, expressar, que me relaciono com a vida de uma forma algo difícil. Maravilhando-me com as coisas belas que me rodeiam. Com a família que desfruto. Com o lugar e a paisagem que escolhi para viver. Ao mesmo tempo que numa atitude inconstante e, eventualmente, egoísta, me sinto um zé ninguém, de quem a vida faz gato sapato. E, por isso me espanto com estes paradoxos. E por isso dou Graças a Deus por conhecer gente, tão bonita, que me rodeia e me faz ver a vida com olhos diferentes todos os dias. É que eu entendo que olhar é diferente de ver. E este último verbo é mais profundo. É mais minucioso. É mais pormenorizado.
Tenho que agradecer ao Deus, em que acredito, tudo o que vivo, sobretudo estas contradições e dúvidas, porque estou convencido que isso me faz crescer como pessoa, como ser humano mas, acima de tudo, como amigo do outro.
Hoje estou um pouco triste e melancólico. Amanhã será outro dia e vou tentar ir buscar força à minha amiga para levar esta vida o mais alegre possível o mais vivo que puder.

6 comentários:

  1. Zé,

    Não posso ficar indiferente e tenho de lhe deixar o meu carinho, uma palavra de apoio.
    É realmente impressionante... o que partilha, o seu texto... a vida das palavras na vida de outros... o seu sentir!
    A expressão do que lhe vai na alma face a quem tanto sofre no seu silêncio mas que tem na voz a "força de viver" emocionou-me. É verdade que são pessoas de uma enorme coragem, que são de admirar pela luta que têm de enfrentar e fazem-no com sorrisos e uma capacidade incrível animando ainda os que os rodeiam! Admiro essas pessoas!
    Lamento a perda desse seu amigo, na situação infeliz que aqui apresentou.
    Deixo-lhe um grande abraço de solidariedade, um enorme sorriso :) e... sabe, uma coisa? Que grande "força de viver" hoje recebi destas suas palavras expressas de forma tão sentida e emocionada!

    Tão longe... mas afinal, é como se estivesse aqui, bem pertinho, sempre com uma palavra amiga!
    Obrigada, por ter partilhado o seu sentir, pois ajuda a que outros se agarrem às boas coisas da vida!

    Beijinhos, com muito carinho e muita amizade!

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  2. Que bom vê-la e senti-la tão perto. Tinha tantas saudades. Estou abalado mas com força para continuar. Porque continuar é preciso, para nós e para os outros. È uma razão para viver.
    A vida é feita de altos e baixos. Não posso deixar de continuar a preparar a "festa" que gizei para a comemoração dos 90 anos do meu pai que se vai realizar de hoje a oito dias. Ele não sabe de nada porque se não ficava ansioso e emocionado. Vou correr um risco: Ele só vai perceber que tem os irmãos, sobrinhos, sobrinhos-netos e alguns amigos no próprio dia. 51 pessoas. É preciso fazer esta espécie de hino à vida.
    Muitos beijinhos e não imagina o prazer que me deu a sua visita. Senti a sua presença aqui a meu lado. E gostei muito. Repetindo-me, até já.
    Caldeira

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  3. Zé,

    Identifico-me com tudo o que diz.No entanto, não tenho medo da morte, mas sim do sofrimento. Gostaria de a enfrentar com altivez,tal como diz Ricardo Reis."E quando entremos pela noite dentro/por nosso pé entremos".
    Mas à medida que envelheço, temo as minhas fragilidades estrurais, que já se começam a sentir.Não gostaria de ficar dependente. Isso horroriza-me e enfraquece-me, mas são pessoas bem doentes que nos dão ânimo.
    Você é boa pessoa, tenho a certeza.
    Durma bem.

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  4. Ibel,
    Penso como você. Atormenta-me o sofrimento. Não tenho medo da morte, porque sendo inevitável, sinto-a como uma passagem. Queria ter a força emanada do que diz Ricardo Reis.
    Eu que sou mais velho do que a Ibel ainda sinto mais agudas as fragilidades, que tento combater com trabalho em favor da Comunidade, voluntária e gratuitamente. Jamais me acoitei em "grupelhos" político, partidários, religiosos ou outros. Apenas tento ver no meu semelhante alguém que precisa mais do que eu e disponho-me a ajudar. Faço-o sempre com alegria e isso dá força para viver. Vivo para os meus Pais, para a minha mulher para as minhas duas filhas.
    Não sei se sou boa pessoa, procuro ser um Ser Humano autêntico.
    Bem-Haja pelo alento.
    Beijinho
    Caldeira

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  5. Zé a vida é muito dura e para a enfrentar precisamos de saber alguns truques. Em relação à morte o meu truque é nunca acreditar nela. Eu sei que é real mas, como não me agrada essa realidade camuflou-a, não a enfrento. Esquecer tudo o que não nos agrada, fingir que não existe é uma solução. Até hoje não tive que a enfrentar cara a cara, nunca vejo uma pessoa morta, sofro pela sua ausência mas menos que sofreria pela sua morte. Quanto à minha saúde, que já teve melhores dias, a idade não perdoa, eu vivo sem estar obcecada com os problemas que vão surgindo e deixou de doer esqueci. Isso tem-me ajudado a minimizar os problemas. Há realmente pessoas excepcionais na maneira como encaram a vida, temos que tentar imita-las. Se há um mundo para além deste lá encontraremos todos os que nos deixaram saudades. Beijinhos

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  6. Zé:
    Nós só sabemos a dimensão da nossa força para enfrentar situações-limite quando as vivemos. tudo o resto são suposições. claro que nem todos somos iguais, mas é de onde menos esperamos que por vezes vêm as surpresas.
    Carpe diem.
    beijo

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