Esta coisa dos velhos pensarem é
uma cavalgada que nos deixa exaustos. Não porque canse o cérebro mas que aperta
e dói o coração.
Sim, por que pensar não é apenas
um acto displicente de cogitar. É muito mais do que isso. É intuir, inferir e
concluir. Intuir sobre o modo, o processo e o resultado. Inferir sobre as
circunstâncias e condições de aplicação do método. Concluir, para o bem e para
o mal, se o modo e o processo foram bem escolhidos, melhor aplicados, para a
obtenção dos melhores resultados.
Até parece que estamos para aqui
a dar lições de sociologia mas é puro engano. Queremos, apenas, analisar o
paradigma da vida dos concidadãos da nossa geração e das gerações que de nós
nasceram.
Somos produto de um tempo e uma
circunstância particular porque nascemos em plena segunda guerra mundial. Somos
filhos homens e mulheres que nunca tiveram tempo de ser meninos, como diria o
Soeiro Pereira Gomes, logo, trabalhadores que não foram à escola, nem tiveram
oportunidades na vida, que lhe permitisse alargar horizontes. A maior parte dos
nossos progenitores ou foram trabalhadores rurais, ou operários indiferenciados,
com vidas plenas de dificuldades de toda a ordem, económicas, sociais,
educativas. Fruto do seu tempo, a sociedade era patriarcal na ordem e no poder
e matriarcal na dedicação, na superação e no amor.
O homem, chefe de família muito
alargada - chegando muitas vezes à dezena de filhos - no desespero e miséria
dos dias, não raro beberrão, para esquecer as agruras da vida, chegava a casa
e, em vez de carinho, distribuía impropérios ou mesmo lambada, pelos que dele
dependiam, mulher e filhos. Não foi numa casa destas que eu nasci e me criei,
bem pelo contrário, mas estamos a falar de padrão social e não de casos
particulares.
Daqui se infere que os nossos
pais que só aprenderam a trabalhar, nos deram a nós, a possibilidade brincarmos,
de irmos à escola e, pelo menos, fazer a quarta classe o que, só por si, num
país de analfabetos, dava a possibilidade de aspirar a um emprego, ainda que
modesto, em empresas, quase sempre familiares e até no Estado, nos escalões
mais baixos da hierarquia, já se vê. Mesmo assim foi um salto qualitativo no
elevador social.
Por sua vez, a nossa geração –
quando falamos em geração falamos num horizonte temporal de vinte e cinco anos –
procurou dar aos filhos todas as possibilidades que, mesmo assim, nós não
tivemos. O nosso grande objectivo era proporcionar todas as condições para que
os nossos filhos pudessem frequentar a Universidade e, na circunstância, a
Universidade de Coimbra, por ser a que mais prestígio carreava junto da opinião
pública, sem nenhum desprimor para as outras existentes, Lisboa, Porto e Évora,
como é óbvio. Era apenas aquela percepção intuitiva e pouco substantiva da
coisa, mas por alguma razão se dizia na época, que Coimbra era a terra dos
doutores.
Como somos a geração do princípio
da emancipação da mulher, pelo trabalho fora de casa, pelo aparecimento da
pílula anticoncepcional, do Maio de 68, da paz e amor, do é proibido proibir,
criámos os nossos descendentes com bonomia quando não, mesmo, com alguma
lassidão, o que teve, como consequência imediata, a instalação de um certo egoísmo,
porque quem não foi habituado a sacrificar-se, a partilhar dificuldades, mas
também haveres, não se habitou a dar.
O que se assiste então: os pais
de hoje dão tudo o que de material existe aos seus filhos, menos atenção e
carinho. É mais fácil ver-se na rua um casal a passear o seu “bobi”, vestido e bem atrelado do que
encolar uma criança. É frequente assistir-se a que os pais se concentrem em
rodas de amigos até aos minutos finais antes da creche fechar para, no último
minuto ir buscar o seu filho que ali deixou, muitas vezes ainda a dormir e o
recebe também a dormir, estando o maior tempo possível longe dos seus rebentos.
Talvez haja aqui algum exagero mas não me digam que não conhecem casos destes e
só eu é que os vejo? Isto para não falar nos pais abandonados, sós, muitas
vezes doentes ou depositados em lares clandestinos, por serem mais baratos e
com menos condições. Também sou só eu que vejo?
O que virão a ser os nossos
netos? É uma pergunta que me martela constantemente a cabeça e para a qual não
encontro resposta. Dizem por aí que a geração dos quinze aos vinte e cinco é a
mais bem preparada de sempre. Será? Preparada em quê? Porque tem diplomas? Onde
estão os valores, a ética, a moral, os costumes, a tradição na inovação?
Não há muito ouvi uma jovem que
estava a concluir o ensino secundário que, quando questionada sobre o que
queria seguir respondeu categoricamente: “quero ser Juiz, porque se ganha muito
dinheiro”. Atente-se no fundamento da aspiração.
Já o dissemos e repetimos. Estamos
a falar de um padrão social e não de casos particulares que, felizmente os há e
são bastantes, onde existe o inverso disto mesmo. Há altruísmo. Há
solidariedade. Há amor ao próximo. Há honestidade.
Merecia maior aprofundamento este
assunto mas o tempo e o espaço são escassos, por isso ficamos por aqui.
Estão a ver porque pensar é
exaustivo?
23/09/2020
Zé Rainho
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