domingo, 28 de novembro de 2010

A tradição já não é o que era!!!???

O canto, ao canto da lareira na aldeia, era coisa habitual. Nesta época, em dias de frio e, com Advento à porta, lá se cantava: Oh! Meu Menino Jesus/ Oh! Meu Menino tão belo/ Logo vieste a nascer/ Na noite do caramelo...
Contavam-se histórias e estórias, em tempos de antanho, sempre com um fundo de ética e moral. Os avós, pais e netos, quando não se juntavam tios, sobrinhos e até vizinhos, numa roda familiar de grande tamanho, participavam, ora cantando, ora ouvindo, em silêncio memorizando, saberes e conhecimentos, que se relacionavam com a vida, em família, e em comunidade.
Hoje, só raramente, se sente que esta tradição ainda vive. A família, alargada, deixou de existir. Até a nuclear se encontra dispersa, em função da empregabilidade, ou da falta dela. Mas que era bonito era.
A estória da "manta" por demais conhecida, que aqui se reproduz para os mais novos, era uma delas: "conta-se que numa casa de pobreza extrema, um velhinho "inútil" para contribuir para o sustento da casa, viu-se levado, pelo filho, para o cume de uma montanha onde foi deixado, com apenas uma manta, à espera da morte. O filho, ainda que, com o coração dilacerado, deixou o pai e iniciou a descida. Quando se distanciara alguns passos ouviu a voz sumida do pai, dizer-lhe: - Filho vem cá e rasga a manta ao meio. O filho perguntou, por que razão? O pai respondeu: -  é que podes vir a precisar da metade da manta quando o teu filho te vier depositar aqui. O filho ficou sem palavras, mas agiu. Pegou no pai às costas e levou-o de novo para casa".
Com estórias deste tipo procurava-se incutir nos mais novos o sentimento da solidariedade, do dever para com os mais frágeis, da partilha do pouco que havia.
Parece que a geração que nos governa nunca teve a dita de partilhar o canto da lareira, ou então o seu egoísmo sobrepõe-se aos sentimentos. No dia 18/Maio/2010, o Diário da República nº 96, II Série, traz 13 (treze) nomeações de motoristas para o Gabinete do Senhor Primeiro Ministro.
Não sei se são necessários, ou mesmo imprescindíveis, tantos motoristas. Mas em altura de pobreza extrema, em que as diferentes Religiões e demais Organizações não Governamentais, apelam à Sociedade, para serem generosos, já que não têm como dar resposta a tanta solicitação para obtenção de alimentos, não seria um exemplo digno, alguma contenção neste tipo de esbanjamento?
A tradição já não é o que era!!!???

6 comentários:

  1. Concordo plenamente, Zé. Mesmo quando a família nuclear é pequena, é por vezes difícil conciliar horários, oportunidades de encontro. As pessoas estão tão ocupadas que se esquecem de fazer um esforço para ao menos, nesta época, se juntarem aos demais familiares.

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  2. Catarina,
    Não só é necessário como indispensável. Principalmente para que se pudessem transmitir os Valores necessários a uma Sociedade melhor.
    Beijo
    Caldeira

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  3. Zé,

    É verdade, a tradição já não é o que era... e as palavras perderam o seu significado... os gestos parecem nem tocar os humanos e aquilo que nos deveria unir como seres acaba por nos desunir e afastar.
    Gostei muito de ler o que escreveu pois, pelo menos, vieram-me à lembrança memórias doces que ainda me recordam que a tradição foi... outrora.
    Esperemoa que onde perdura se consiga mantê-la viva...
    Obrigada! E perante a neve que já hoje vi e senti (e que me delicia corpo e alma), o seu texto trouxe-me a ternura de um passado já vivido, que recordo com saudade, uma saudadosa saudade...

    É sempre um prazer estar aqui!
    Beijinhos

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  4. JB,
    Bem-Haja pelas palavras elogiosas. Sabe que eu gosto de mostrar aos mais jovens aquilo que eu conheço de vivências da minha meninice. Parece um paradoxo, porque este escrevente foi toda a sua vida um citadino. Desde os onze anos de idade que viveu em grandes centros urbanos mas nunca se esqueceu dos serões em casa dos avós.
    Também vi neve hoje e até tive algum receio. Fui dar uma aula à Covilhã e começou a nevar com alguma intensidade e a solidificar nas valetas, mas felizmente tudo correu bem.
    Gosto muito de a ver por aqui. Fico muito feliz. Aprecio imenso a sua visita e a sua escrita.
    Beijinho grande e muito amigo.
    Caldeira

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  5. Zé que linda história, não conhecia, choca mas, é a realidade, hoje muitos velhos são abandonados, nos lares ou em casa. Nesta sociedade, sem dinheiro, porque se for um velho com dinheiro a realidade já não é esta, o destino é o lixo, fique lá onde ficar esse lixo. Excelente. Beijinhos

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  6. Brown Eyes,
    Tem toda a razão. Quem não tem não é. Essa é a tragédia humana.
    Beijinhos
    Caldeira

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