sábado, 16 de julho de 2022

A MODA!

 

A MODA!

A moda é o substrato do esquecimento. Aquilo que hoje esquecemos foi ontem o nosso encantamento. Aquilo que hoje é o nosso enlevo, amanhã não passará de recordação. É efémera. Quase me atrevia a dizer que é inútil, embora aceite que o ser humano é um constante insaciável e, como tal, necessite da ilusão para se sentir feliz. Mas, a moda entra na nossa vida, sem bater à porta nem permissão e acomoda-se no sofá da nossa permissividade, o que no mínimo é alienável e pode configurar total obscurantismo.

Quando falamos de moda não nos estamos a referir, como é óbvio, apenas, ao vestuário, ao calçado, ao penteado ou outros adereços que compõem a nossa aparência. A moda é muito mais do que isso e enxameia todos os sectores da vida nacional só que, umas vezes é mais discreta e outras mais atrevida e provocatória.

Comecemos pelo futebol. A moda hoje não é jogar bem à bola é, antes, comentar lances, hipotéticas faltas, estratégica e tácticas de jogadores e treinadores. Quem tem o palco não são os intervenientes no terreno, são os comentadores, os especialistas. A moda é, pois, os especialistas. Estes é que têm tempo de antena. Um jogo demora noventa e poucos minutos, o comentário, por diversos especialistas, demora quatro horas.

Por aqui vemos, também, que hoje há a moda dos especialistas. Há-os para todos os gostos e feitios, ainda que a maioria deles nunca tenha experienciado fazer o que comenta. E, como não sabe fazer, comenta, fala, manda bitaites, dá palpites.

Se isto é verdade no futebol, também o é nos incêndios, só para dar um exemplo da actualidade. Ninguém ouve um bombeiro, um comandante de bombeiros, que anda dias e noites, horas sem fim, no meio de um braseiro infernal, esgotado, física e psicologicamente, sobre o que está a viver. As suas angústias e da sua família. As perdas próprias para defender as perdas alheias, mas aparecem, aos magotes os especialistas estrelados a dizer coisas, muitas delas sem nexo. E são mais que as mães. Transportados em carros de luxo, tudo sofisticado, enquanto o bombeiro se deslocou para a tragédia – agora não se designa assim, porque os estrelados entendem que se deve chamar teatro das operações - num carro de combate, muitas vezes a cair de podre. São modas.

Mas também os políticos, os que têm as maiores responsabilidades, que se arrogam o direito de ser especialistas e dizerem que a culpa é das pessoas que trabalham a terra. Que são descuidados. Que não registam os terrenos. Que não os limpam. Esquecendo-se que a maioria dos pequenos proprietários fica sem nada para o seu sustento, não têm dinheiro para comer e para os medicamentos, quanto mais para limpar uma floresta que não lhes dá nada, mas que enche os bolsos a muita gente, que nada fez por ela. Enquanto isso vêem os terrenos cuja responsabilidade é dos organismos estatais sem qualquer tipo de intervenção, na boa prática de “bem prega frei Tomás, façamos os que ele diz, mas não o que ele faz”. São especialistas.

Se formas para a Educação, para a Saúde, para a Justiça, para a Segurança não acontece nada de diferente. Quem mete as mãos na massa – quem trabalha no duro, não quem se aproveita dos louros ou do dinheiro - não tem voz, mas os especialistas de gabinete, atordoam-nos com soluções mirabolantes, de sucesso indiscutível.

São modas e, tal como a moda, talvez passe depressa.

15/07/2022

Zé Rainho

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