quarta-feira, 22 de julho de 2020

TROVADORES DE OUTRAS ERAS




O Poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente
(Fernando Pessoa)

Não sendo poeta, deixem-me, pelo menos, ser fingidor:

Os trovadores de outros tempos
Terçavam palavras, argumentos,
Para conquistar amores e amos,
Numa vida de boémia e de enganos.

Infantes e cavaleiros batalhavam,
Por ideias, causas e honravam,
Suas raízes, seus maiores e a grei,
Hoje há guerras sem roque e sem rei.

Fora eu um poeta como os trovadores,
Com dom, saber, eloquência, amores,
E cantaria aos quatro ventos as mágoas,
De ver o despovoamento destas fráguas.

Queria ser um trovador para encantar,
Dizer odes a todos, exaltantes e cantar,
Tudo o que povoa meu sonho e ansiedade
Aquietando este coração, fraco, pela idade.

Queria conquistar o coração do poderoso,
Dizer-lhe que deve ser sereno e bondoso,
Para com o seu subordinado, mas irmão,
Para que em nenhum lar falte o pão.

Usaria palavras vigorosas contra a violência
Que vai do casal ao povo, com inclemência
Sem que haja razão mais que o dinheiro.
Sendo este um deus menor e não Primeiro.

Não tendo dotes de verborreia e oratória,
Nem sendo daqueles que fazem história,
Resta-me a particular e singela indignação,
Que não conta para nada nesta Nação.



Zé Rainho

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